sexta-feira, março 23, 2007

ESPIRRANDO OS ESTORVOS

Essas epidemias de gripe, atribuídas ao período de inverno são, principalmente, as epidemias de carências que afloram, o fluxo e refluxo das almas em suas eternas agonias de mares bravios, e os espirros querem pôr pra fora, com mais ou menos veemência, as coisas que nos atormentam, aquilo que queremos expulsar para nos sentirmos livres de "incômodos" que estamos tendo que suportar. Então, atingido o limite do suportável, desencadeia-se o processo de gradativa volta à normalidade.Depois de ter espirrado um fim de semana inteiro, espirros terríveis, mas que, segundo uma vítima deles, dão uma sensação de orgasmo, acho que encontrei finalmente a "paz" na segunda-feira, tendo "espirrado" pra fora de casa toda a família, e me sentindo maravilhosamente sozinha. E o seria completamente, não fora a presença do meu gato preto que ainda é um estorvo onipresente.A gripe é muito providencial. Ela vem pra nos ajudar a dar nome a nossa irritação, ao nosso desconforto gerado por desejos nunca satisfeitos, ela "autoriza" até o mau humor. Justifica todos os chutes no gato e na porta, sem falar na finalidade de espantar uma companhia indesejada. Ela te faz poder estar presente sem "ter" que fazer uma porção de coisas não desejadas. Ninguém te convida para ir àqueles lugares que tu detestas, ninguém te diz pra colocar tal roupa ou pentear melhor o cabelo. Tu ficas simplesmente livre no recinto sagrado do lar e tudo que fizeres vai ser apreciado como um "sacrifício", mesmo que, sendo dona de casa como eu, a comida venha de fora e tu não cumpras a maioria das tarefas rotineiras.Por isso não há remédio pra curar a gripe. Ela vem pra nos ajudar e não devemos varrê-la tão afoitamente. É ela quem nos cura e vai embora quando "queremos", mas com aquele querer mais escondido, aquele que sabe das nossas verdadeiras necessidades.

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