sexta-feira, março 23, 2007

ELES NÃO SE DEIXAM LIBERTAR FACILMENTE

Os tupiniquins e os tupinambás eram os primitivos habitantes na região central do país, onde aportaram os portugueses pela primeira vez. Hoje eles não são muito lembrados , apesar de a língua tupi ainda estar presente mais do que muita gente tenha conhecimento, no idioma português. Infelizmente, dentro de uma visão racista em relação aos índios,adotou-se o epíteto tupiniquim, para designar o que há lá fora e que, transposto para nossa realidade, sofre uma espécie de mutação para pior. Passamos assim, a ter atitude depreciativa de dominados,em relação à nossas características particulares, em uma atitude depreciativa de quem só valoriza o que vem de países ricos.Até a segunda guerra macaqueamos a França, que pelo menos nos ofereceu um modelo com melhores valores. Depois a "América" passou a dominar, impondo sua modernidade predadora. Era um progresso que deixava a todos embasbacados e pelo qual a natureza ainda paga um alto preço. Eles se autodenominaram assim, numa demonstração de dominadores. Outro dia um garoto me falou que sendo apresentado para uma norteamericana ela teria dito:I'm american, ao que ele respondeu: I'm american too, from South America. Ela teria olhado pra ele de forma estranha sem comentar. Nada contra a menina, ela só reflete uma mentalidade e uma maneira prática que eles tem de ver o resto do mundo, tudo são "business", "money", nós somos grandes, a América somos nós, fomos ao Iraque para salvar o povo tirando-o das garras de Saddan. Conta-se que ante a resistência de um iraquiano em receber ajuda de um soldado, este teria comentado: "os iraquianos não se deixam libertar facilmente."O neoliberalismo nasce dessa mesma visão de"liberdade". Desde que o mundo é mundo ,sempre houve houve opressores e oprimidos. Nem as maneiras de estabelecer esse domínio mudaram tanto. Assim fizeram os romanos em relação à Grécia e os portugueses, no momento em que começaram a explorar as riquezas do país, a partir de 1700. A receita é a mesma: impõe-se a língua do vencedor e a partir daí passa-se a um trabalho de desaculturação para facilitar o domínio. Em nosso país, enquanto não havia aqui interesse comercial, falou-se a língua tupi. Mesmo o padre Manoel da Nóbrega, falava fluentemente essa língua. No início do século XVIII, com o incremento da exploração de minérios, pedras preciosas e outras riquezas Portugal exportou para cá seus escrivães e outros funcionários encarregados da coleta e exportação dos produtos.Estes falavam e, principalmente, escreviam o português. Assim, aos poucos, a língua indígena foi se recolhendo para sítios mais restritos.Os nossos "libertadores", através de políticos e imprensa engajada, vem alardeando há tempos a idéia de que os governos devem privatizar empresas estatais porque só trazem prejuízo. Assim, já nos livramos de vários desses chamados entulhos sem ser comprovado nenhum resultado. Ao contrário do que se argumentou a favor dessas transações, no auge da euforia no primeiro governo de FHC, a dívida só fez aumentar, passando de 500 bilhões para o atual um trilhão.Nesse trem da alegria, vendeu-se um empresa como a Vale do Rio Doce ,em 1997, numa legítima ação de entreguismo,por três bilhões e meio, quando ela, só no primeiro trimestre daquele ano, faturara essa quantia. Em outubro de 2005 a juíza Selene Maria de Almeida resolveu abrir um processo de anulação da referida venda, sob alegações inquestionáveis. Em dezembro do mesmo ano conseguiu reabrir o processo que agora deve começar a ouvir testemunhas. A primeira acusação é que a empresa encarregada de fazer a avaliação, a Merrill Linch, era ligada a que comprou, tendo passado a ela informações sigilosas e subavaliado a empresa.Além disso, cita-se a participação do Banco Bradesco como consultor e que mais tarde viria a tornar-se acionista. Outra irregularidade refere-se à venda de 26 milhões de hectares, o que fica muito além dos dois mil permitidos, sem que se passe pela aprovação do Congresso. Além disso, a presença de urânio nos minérios extraídos, por si só, deveria sustar a venda, lembra a juíza. Sem falar no dinheiro do BNDES do qual quatro diretores estão respondendo a processo por conta dessa ação. Na éoca lembro que houve um espernear em forma de liminares partindo de entidades, políticos, partidos e outros interessados mas bem ligeiro tudo foi superado e se entregou à sanha de estrangeiros uma empresa prontinha, sem falar na venda de nosso subsolo, cujas riquezas são imensas em vários tipos de minérios. Foi tudo rápido e de um silêncio conivente. Parlamentares que agora vêm colocar o dedo na cara dos atuais detentores do título de ladrões, já fizeram por merecer, apoiando essa transação vergonhosa. E o povo, como sempre, canta conforme a música , dando eco à sinfonia do momento. Bem ao gosto de quem quer deixar o debate no nível de confronto moral, com um sem fim de escândalos. Marcos Valério não é novo no cenário da república. Isso ficou bem claro em suas declarações. E a gritaria providencial deixa a gente tonto e dificulta outros questionamentos, principalmente este, um legítimo atentado contra a soberania nacional. E não faltou nem a piada para entreter por semanas o imaginário popular, com a história do dinheiro na cueca. Assim também se oferece circo para o povo que, como as ovelhas de Orwel, fica rindo e repetindo bé, bé, bééé...O presidente FHC prestou seu grande desserviço à nação, para usar uma palavra mais branda. Teve o seu momento de glória, que mais tarde comemorou inaugurando um apartamento, onde os móveis eram todos do séc. XVII. Coisas de gente culta e refinada que a plebe não sabe apreciar.Mas o que se vê em todo mundo é essa febre de fazer dinheiro com dinheiro, grandes empresas como a Nike engolindo outras também grandes, numa antropofagia assustadora que põe na tela arrepiantes previsões dignas da mais audaciosa ficção científica.Recebi outro dia um email onde um professor da USPdeu-se ao trabalho de achincalhar o atual presidente com argumentações no mínimo impróprias para um catedrático de tão alto gabarito. Entre outras coisas, disse que Lula é o Forest Gump tupiniquim e faz sucesso lá fora como raridade, tal qual o mico leão dourado. O dito professor de biologia encarnou bem o espírito do dominado que olha com inveja e cobiça para aquele mundo do hemisfério norte , e que depois de tantos cursos de graduação pensa que transformar o intelecto num banco de dados é o que torna uma pessoa superior à outra. Também comete racismo, depreciando a cultura indígena,ao usar a palavra tupiniquimde forma pejorativa. O presidente Hugo Chavez tem recebido seu quinhão de desprezo, só porque , como aquele iraquiano, não se deixa libertar facilmente, imaginem, aquele índio com cara de pobre, "quem ele pensa que é?"Tenho no meu quarto um balaio feito pelos índios. Deixei –o num lugar bem visível e nunca esqueço daquela mulher de olhos puxados no meu portão com um menino num braço e o tal balaio no outro. Aquela gente jogada pelas calçadas um dia foi dona dessa terra e não precisava mendigar para viver. Nós ainda trazemos na língua que falamos a música e a ternura desses povos ancestrais. Eles são nossos verdadeiros pais. A eles devemos, se outra coisa não podemos dar, pelo menos um grande respeito. Xingar alguém de tupiniquim é rejeitar sua própria identidade cultural, suas origens, isso sim, é se auto-depreciar como povo .

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